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China terá, em breve, mais pets do que crianças pequenas; entenda por que equação ameaça economia

Casados há sete anos, Hansen e sua esposa Momo cuidam de seis pequenos em seu apartamento no centro de Pequim.

Mas eles adotam uma rotina pouco diferente da típica da maioria das mães e pais: eles brincam de buscar objetos e os levam para passear diariamente.

Esses pequenos não são seus filhos, mas “mao hai zi”, “bebês de pelos” em português, e o casal os ama tanto que se refere aos cachorros como “nossas filhas, nossos filhos”.

“Eles são todos parte da nossa família. Somos uma grande família”, disse Momo, apelido utilizado por medo de ter problemas com autoridades por falar abertamente sobre sua escolha de estilo de vida — por estar em desacordo com esforço da China para aumentar as taxas de natalidade.

A China está enfrentando um rápido envelhecimento da população e uma força de trabalho em declínio após décadas instituindo a política de filho único. O país também é um dos lugares mais caros do mundo para criar uma criança em termos relativos, superando Austrália e França, de acordo com um estudo do Instituto de Pesquisa de População YuWa, realizado no início deste ano.

Após o fim da política de filho único em 2016 e mais uma grande mudança na política de natalidade em 2021, o governo agora quer que os casais tenham três filhos. Mas o governo chinês não vem tendo tanta facilidade em aumentar os nascimentos quanto foi em desencorajá-los.

Muitos casais chineses como Hansen, 36, e Momo, 35, não estão 100% convencidos a ter filhos. Em vez disso, tornaram-se pais de pets.

Até o final deste ano, o número de pets nas cidades da China deve superar o número de crianças de até quatro anos, de acordo com um relatório de julho da Goldman Sachs, que analisou o aumento da demanda por alimentos para animais de estimação.

Até 2030, o número de pets na área urbana da China será quase o dobro do número de crianças pequenas em todo o país, de acordo com a projeção. A taxa de posse de animais de estimação do país seria ainda maior se o número de cães e gatos nas áreas rurais fosse incluído.

As estimativas do Goldman Sachs refletem os valores em mudança de uma geração que não segue mais o pensamento tradicional de que o casamento se trata de ter filhos e continuar a linhagem familiar.

“Diferentes gerações valorizam as coisas de maneira diferente, sabe”, disse Hansen, que também deu apenas seu apelido.

Economia de pets em expansão

Ao prever o aumento nas vendas de alimentos para cães e gatos, o Goldman Sachs revelou uma tendência que vem causando uma grande dor de cabeça aos oficiais chineses.

A população do país caiu pela primeira vez em décadas em 2022, no que analistas disseram ser a primeira queda desde a fome de 1961, desencadeada pelo desastroso plano do ex-líder Mao Tsé-Tung, o Grande Salto Adiante. Um ano depois, a China foi ultrapassada pela Índia como o país mais populoso do mundo.

O Goldman descobriu que a comida para pets é um dos setores de consumo que mais crescem na China, se expandindo apesar do consumo relativamente fraco. As vendas cresceram cerca de 16% entre 2017 e 2023, criando uma indústria de US$ 7 bilhões. O valor da indústria deve saltar para US$ 12 bilhões em 2030, aponta o relatório.

No cenário mais otimista, a comida para pets poderia se tornar uma indústria de US$ 15 bilhões na China em seis anos.

É um contraste com apenas duas décadas atrás, quando possuir um pet ainda era considerado um conceito burguês e as pessoas mantinham raças mistas como cães de guarda.

Ainda hoje, a posse de pets continua relativamente baixa, de acordo com o Goldman Sachs. No ano passado, o percentual de lares que possuíam cães nas cidades chinesas era de 5,6%, significativamente menor que os países vizinhos e possui espaço para crescer, disse o relatório. O Japão alcançou a marca de 17,5% em 2009.

As previsões para bebês foram menos otimistas. O relatório projetou que o número de novos nascimentos na China diminuirá a uma taxa anual média de 4,2% entre 2022 e 2030, devido à queda no número de mulheres no grupo de 20 a 35 anos, assim como à relutância dos jovens em ter filhos.

“Esperamos ver um ímpeto mais forte na posse de pets em meio a uma perspectiva relativamente mais fraca de taxa de natalidade e uma maior penetração incremental de pets nos lares da geração mais jovem”, acrescentou o relatório.

Muitos casais acham difícil enfrentar o custo crescente de criar filhos em uma economia incerta. A segunda maior economia do mundo enfrenta problemas que vão do alto desemprego juvenil até uma crise imobiliária prolongada.

Autoridades agora estão oferecendo uma série de incentivos, desde dinheiro até uma licença parental maior, para promover a paternidade — uma reversão completa das medidas anteriores para conter a superpopulação, que incluíam aborto forçado e esterilização.

Mas, como muitos países no Leste Asiático, os novos benefícios não estão tendo muito efeito.

A população da China caiu para 1,409 bilhão no ano passado, encolhendo por dois anos consecutivos. Sua taxa de natalidade também caiu para 6,39 nascimentos por 1.000 pessoas, a taxa mais baixa desde a fundação da China como conhecemos em 1949.

Mudança de mentalidade

Tao, 38, administradora do hotel para cães Space, em Pequim, considera que a preferência por pets significa bons negócios.

Com o feriado do Dia Nacional da China se aproximando rapidamente, donos de cães estão correndo para encontrar alguém para cuidar de seus pets durante a alta temporada de viagens que começa em 1º de outubro.

“Estávamos quase totalmente reservados para esse feriado”, disse ela.

Tao, apelido da empresária, tem dois cães e nenhum filho. Sua família costumava pressioná-la para ter crianças, disse ela, mas ela sabia que essa não era a vida que queria.

“Eu gosto do meu estilo de vida. Meu parceiro e eu viajaremos muito. Eu gosto de conhecer o mundo. Então, a ideia de ter filhos simplesmente não era atraente o suficiente para mim”, disse ela.

Ela sentiu que a mentalidade da geração mais jovem mudou. “Eu sinto que as pessoas começam a ser mais assim: ‘isso é o que eu quero’ ou ‘isso é o que eu gosto para a minha vida’, em vez de ‘isso é o que a sociedade me ensinou a fazer’ ou ‘isso é o que meus pais querem que eu faça’”, acrescentou Tao.

Stuart Gietel-Basten, professor de ciências sociais e políticas públicas na Universidade de Ciência e Tecnologia de Hong Kong, disse que crianças e pets não são mutuamente exclusivos na China.

Mas os jovens casais estão enfrentando desafios crescentes, desde o desemprego até a pressão social, como longas jornadas de trabalho e a expectativa de que algumas mulheres desistam de suas carreiras após o nascimento de um filho, disse ele.

“Se você é um jovem de 20 e poucos anos na China e sente uma forte necessidade de cuidar, é muito mais fácil conseguir um filhote de cachorro, gato ou coelho do que encontrar um parceiro para se casar e ter filhos”, disse Gietel-Basten.

Para Hansen e Momo, eles simplesmente aproveitam a companhia de seus bebês de pelos.

“Não estamos seguindo nenhuma tendência. Não somos afetados por elas. É apenas nossa própria escolha. Acho que é só que amamos cachorros”, disse Hansen.

Ele disse que aguardava ansiosamente para voltar para casa todos os dias porque seus cães ficam muito animados em vê-lo.

“Isso cura tudo”, disse ele.

Em uma conferência de mulheres no ano passado, o líder chinês Xi Jinping deu uma palestra aos ouvintes sobre fomentar um novo tipo de cultura de casamento e procriação. A mensagem era clara para as mulheres chinesas: Case-se e tenha filhos.

Mas Momo diz que o país deveria “se virar” sem seus genes.

“Sinto que [a China] não precisa dessa criança que eu teria”, disse ela.

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