O cancelamento da viagem do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, à Europa nos próximos dias vai dar uma pressão adicional para que a equipe econômica “acelere” a proposta do pacote de cortes de gastos nesta semana, segundo interlocutores do chefe da pasta.
Apesar de se manter cauteloso quanto às medidas e, por vezes, não confirmar o que vem sendo ventilado em bastidores, a expectativa é de que o chefe da equipe econômica comece a dar mais pistas do que está por vir.
O ministro ainda deve apresentar a proposta final de Lula antes dela ser, de fato, confirmada. Nesta segunda-feira (4), Haddad também se encontra com o presidente no Palácio do Planalto, às 9h, e o assunto tende a estar na mesa.
Ainda assim, a notícia de que Haddad vai ficar em Brasília debruçado nas propostas fiscais dividiu economistas ouvidos pela CNN.
Para o ex-ministro da Fazenda Maílson da Nóbrega, a decisão de evitar uma viagem internacional em um momento sensível para as contas públicas foi acertada.
À CNN, ele reforçou que, nesse contexto, a presença do ministro da Fazenda ao lado do presidente da República é essencial para discutir medidas que promovam a estabilidade econômica. Para ele, a decisão era esperada e se alinha ao bom-senso, dado o cenário desafiador.
“Desde a Constituição de 88, todas as medidas de ajuste fiscal foram de natureza temporária. À medida que a rigidez piora, demanda medidas que ataquem a causa. Mas nunca há ambiente para isso. Apenas há suspensão de alguns gastos, mas nada definitivo. Acho meritório o trabalho da equipe econômica, as coisas só não avançam nesse sentido estrutural por conta de resistências no PT e no governo. A ausência do ministro nesse momento seria equivocada. O mercado vinha criando esperança.”
Segundo o estrategista-chefe do grupo Laatus, Jefferson Laatus, o cancelamento da viagem foi uma resposta ao “recado do mercado”, mas que isso deve vir com ações concretas para ter o alívio esperado e duradouro.
“O mercado está sedento por informações sobre a questão fiscal. O mercado precisa dessa previsibilidade para fazer preço. Não adianta nada cancelar a viagem sem apresentar nada concreto. Se o pacote fiscal não vier com o rigor esperado e com coerência a longo prazo, a situação pode piorar. O dólar pode até chegar a seis reais”, afirmou.
Porém, o recuo teria vindo tarde demais para José Márcio Camargo, economista-chefe da Genial Investimentos.
Em meio a esse cenário de expectativa do mercado pelas medidas de contenção, Camargo aponta para uma “total desconsideração com a economia brasileira” por parte do ministro da Fazenda.
“Quanto ao pacote, melhor esperar para ver o que vai sair. Não estou otimista. Seria necessário algo como controle de gastos sociais ou mudança na política do salário mínimo. Algo realmente forte. Mas, minha avaliação é bem negativa”, pontua o economista-chefe da Genial Investimentos.
Na terça-feira (29), Haddad havia sinalizado que o prazo de envio para as medidas estava em aberto, e que a definição do pacote dependia do aval de Lula.
Sem dar detalhamentos sobre o que está por vir, o ministro voltou a ser questionado no dia seguinte sobre a contenção de gastos, ao que criticou ser uma insistência “boba” do mercado e da imprensa.
Mesmo com o cancelamento da viagem, o mercado segue no escuro e vivendo essa tensão pré-revisão de despesas.
Desse modo, apesar de ter algum alívio com a decisão de Haddad ficar no Brasil, nada muda entre os investidores, que seguem em alerta até “o anúncio de fato do pacote”, segundo Paulo Gala, professor da Fundação Getúlio Vargas e economista-chefe do Banco Master.
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