As notícias sobre a economia brasileira entre a última decisão de juros do Banco Central (BC) e a desta quarta-feira (6) revelam um cenário pior que o esperado, segundo casas de investimento e economistas ouvidos pela CNN.
“Cabe assinalar que, desde a última reunião, diversos fatores evoluíram desfavoravelmente”, afirma relatório da Warren Investimentos publicado na segunda-feira (4).
Dentre os fatores destacados pelo estrategista-chefe da casa, Sérgio Goldenstein, estão a depreciação do real, as expectativas de inflação desancoradas, a alta dos preços próxima do teto de 4,5% da meta do BC, o mercado de trabalho aquecido – o que tende a sustentar o consumo e a inflação – e o prêmio de risco elevado do país.
“O panorama ficou ainda mais preocupante. O câmbio se depreciou mais, mesmo partindo de uma patamar já alto. Isso decorreu, no período recente, da piora do sentimento do mercado com relação ao cenário fiscal do país, o que elevou o prêmio de risco, e, no ambiente externo, ao favoritismo de Trump nas eleições presidenciais, pois as políticas que defende são vistas como mais inflacionárias, o que causou uma alta das taxas dos títulos norte-americanos e uma valorização global do dolar, em particular contra as moedas da América Latina”, pontua Goldenstein.
Desse modo, a mediana do mercado apresentada no Boletim Focus – que é compilado pelo próprio BC – é de que a taxa Selic, o juro básico do país, seja elevada em 0,5 ponto percentual, chegando em 11,25%.
Na reunião de setembro, a decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) foi de retomar o ciclo de alta com elevação de 0,25 ponto.
O principal dos fatores que vem sendo apontado pela elevação do risco de investimento no Brasil é o cenário fiscal, que por consequência também deteriora as outras variáveis apontadas.
“O risco fiscal impacta as expectativas, o prêmio de risco do país, a taxa de câmbio, e tem efeitos indiretos sobre a inflação. A política fiscal de aumento de gastos ativa a atividade econômica, e isso dificulta a desaceleração da inflação, o que pode até gerar pressões inflacionárias no futuro”, aponta Gustavo Sung, economista-chefe da Suno Research.
“Então, o que o mercado hoje, nós estamos preocupados, além do cumprimento da meta fiscal e a sobrevivência do novo arcabouço, é a trajetória da dívida pública que deve continuar crescendo. O governo tem que dar sinais claros do seu comprometimento de reduzir o ritmo de crescimento da dívida”, conclui.
Nas últimas semanas, o mercado vem aguardando uma série de medidas de ajuste fiscal que o governo vinha prometendo anunciar após o fim das eleições.
Passados os dois turnos do pleito municipal, a ansiedade dos investidores vem crescendo ao passo que cada aparição pública de autoridades como o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, termina sem maiores esclarecimentos sobre as medidas que estão por vir.
No dia 29 de setembro, Haddad havia sinalizado que o prazo de envio para as medidas estava em aberto, e que a definição do pacote dependia do aval de Lula.
Sem dar detalhamentos sobre as medidas, o ministro voltou a ser questionado na tarde seguinte sobre a contenção de gastos, ao que criticou ser uma insistência “boba” do mercado e da imprensa.
“São esses fatores que ainda preocupam, principalmente do ponto de vista fiscal. O governo não está fazendo os cortes necessários para cumprir com o arcabouço, e o clima se deteriorou porque o governo disse que anunciaria as novas medidas após as eleições. É um cenário preocupante oriundo do fiscal. Não basta o anúncio, tem que ser anunciadas medidas críveis. Enquanto não acontecer, o mercado seguirá em alerta”, diz Helena Veronese, economista-chefe da B.Side Investimentos.
Por conta disso, Goldenstein vê o ministro Haddad e o futuro presidente do Banco Central (BC), Gabriel Galípolo, como peças fundamentais no processo de convencimento ao restante do governo acerca da necessidade de uma política fiscal mais robusta.
“É importante aguardar os detalhes do pacote, mas, pelo que vem sendo veiculado, há, além de medidas pontuais, medidas estruturais que permitiriam um caminho mais fácil rumo ao equilíbrio fiscal”, conclui o estrategista-chefe da Warren.
Piora do cenário
No dia 18 de setembro, data da última decisão do Copom, o dólar encerrou o pregão em R$ 5,46. Apesar do patamar elevado, a divisa norte-americana vinha em uma sequência de quedas desde o dia 11 e que seguiria até o final daquele mês.
Desde então, a cotação do dólar voltou a subir, chegando ao maior patamar desde a pandemia (R$ 5,87) na sexta-feira (1º). Além de fatores externos – como incertezas rondando as eleições dos Estados Unidos e o conflito no Oriente Médio -, o cenário doméstico, pautado pelo fiscal, foi um dos principais elementos na cabeça dos investidores.
Enquanto isso, a inflação no país também acelerou. O último informe do IBGE foi sobre o IPCA-15 de outubro, indicador tido como a prévia da inflação oficial do país. No mês, a alta dos preços chegou a 0,54%, acumulando variação de 4,47% nos últimos 12 meses, encostando no teto da meta.
Já em setembro, o resultado do indicador havia sido de 0,13% na comparação com agosto e de 4,12% no acumulado.
“O fluxo de dados e notícias desde a última reunião do Copom reforça a necessidade de uma política monetária mais restritiva do que o projetado inicialmente para que o IPCA convirja à meta”, avaliam os economistas da XP em relatório.
Desse modo, as incertezas se mantém também para o longo prazo. Nas últimas reuniões do Copom, o colegiado tem evitado cravar como será esse ciclo de altas, para deixar suas decisões em aberto a depender da evolução do cenário.
Em seu relatório, a XP destaca que o BC deve seguir sem definir a magnitude total do ciclo, se mantendo vigilante sobre as incertezas.
Tendo em vista o risco, a expectativa do mercado sobre o nível dos juros segue deteriorando – como apurado pelo Focus dessa semana -, de modo que os agentes apontam que a Selic só deve voltar a cair no final de 2025.