As mudanças climáticas causadas pelo homem deixaram 40% mais intensas e de 4 a 5 vezes mais prováveis as condições quentes, secas e ventosas no Pantanal, impulsionando os incêndios catastróficos durante junho deste ano. A informação é do primeiro estudo de atribuição sobre este evento realizado pela World Weather Attribution (WWA), uma rede internacional de cientistas de clima.
O estudo foi conduzido por 18 pesquisadores como parte do grupo World Weather Attribution (WWA), incluindo cientistas de universidades e agências meteorológicas no Brasil, Portugal, Estados Unidos, Suécia, Países Baixos e Reino Unido.
“Os incêndios no Pantanal deste ano têm o potencial de se tornarem os piores de todos. Esperam-se condições ainda mais quentes ao longo deste mês e dos próximos meses, e há uma ameaça considerável de que os incêndios possam queimar mais de três milhões de hectares”, alerta Filippe Lemos Maia Santos, cientista brasileiro participante do estudo.
O levantamento destaca a necessidade urgente de substituir os combustíveis fósseis por energia renovável globalmente, reduzir o desmatamento e reforçar as proibições de queimadas controladas para enfrentar o impacto dos incêndios florestais na vida selvagem, comunidades indígenas e agricultores.
“Nosso estudo deve ser visto como um alerta – se o mundo continuar queimando combustíveis fósseis, ecossistemas preciosos como o Pantanal e a floresta amazônica podem ultrapassar pontos de inflexão onde a recuperação natural de incêndios florestais e secas se torna impossível”, disse Friederike Otto, professora de Ciências Climáticas no Grantham Institute do Imperial College London.
Dados do Estudo
O Pantanal, maior pântano tropical do mundo, está vivenciando uma temporada devastadora de incêndios. Mais de 1,2 milhão de hectares (12.000 km²) são considerados queimados – cerca de 8% do Pantanal brasileiro. Os incêndios começaram no final de maio, após uma temporada de chuvas extremamente fraca.
Em junho, o Pantanal registrou incêndios florestais devastadores, com uma estimativa de 440.000 hectares queimados, quebrando o recorde anterior de junho de 257.000 hectares. O pico da temporada de incêndios normalmente ocorre em agosto e setembro.
FOTOS – Queimadas em junho no Pantanal
Antes das mudanças climáticas, as condições de clima para incêndios observadas em junho eram extremamente raras – esperadas apenas cerca de uma vez a cada 160 anos. Agora são quase cinco vezes mais prováveis, estimadas para ocorrer cerca de uma vez a cada 35 anos. Se o aquecimento global alcançar 2°C, condições semelhantes de clima para incêndios em junho se tornarão 17% mais intensas e ocorrerão em média cerca de uma vez a cada 18 anos.
Mais de 90% do Pantanal está fora de áreas protegidas, das quais cerca de 80% é utilizado para pecuária, onde o fogo é usado para limpar a vegetação e para criar novos pastos. As origens dos incêndios ocorridos em junho são investigadas pela Polícia Federal.
O Pantanal é um hotspot de biodiversidade, lar de espécies ameaçadas como jaguares, lontras gigantes e cervos-do-pantanal. É provável que os incêndios deste ano já tenham matado milhões de animais – estima-se que 17 milhões de vertebrados tenham morrido na temporada de incêndios de 2020 no Pantanal.
“Corpos carbonizados de cobras, jacarés e macacos são uma ilustração trágica da devastação ecológica causada pelos incêndios no Pantanal. É provável que milhões de animais já tenham perecido nos incêndios florestais”, afirma Otto.
Os cientistas concordam que as mudanças climáticas estão aumentando o risco de incêndios florestais começarem e se espalharem à medida que o calor persistente seca os solos e a vegetação, criando condições mais inflamáveis. Para quantificar o efeito do aquecimento causado pelo homem nos incêndios do Pantanal, os pesquisadores analisaram dados climáticos e modelos climáticos usando métodos revisados por pares.
O estudo focou nos incêndios florestais que ocorreram durante junho no Pantanal brasileiro e analisou o Daily Severity Rating (DSR), uma métrica que considera temperatura, umidade, velocidade do vento e precipitação para estimar a intensidade potencial de um incêndio e quão difícil será apagá-lo. As temperaturas no Pantanal estão se tornando mais quentes e a precipitação e umidade relativa estão diminuindo à medida que o clima aquece, aumentando significativamente o risco de incêndio.