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Por erro da torre, aviões da Gol e da Azul estiveram a 22 metros de colisão durante pouso em SP

Um Embraer E-190 da Azul e um Boeing 737 da Gol estiveram a pouco menos de 22 metros de se colidirem durante um pouso no aeroporto de Congonhas, em São Paulo. O incidente ocorreu em dezembro de 2020, mas o relatório do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa) sobre o caso ficou pronto somente nesta semana.

A ocorrência foi classificada pelo Cenipa como incidente grave e de alto risco, no qual a colisão foi evitada por pouco. Ao todo, 242 pessoas –entre passageiros e tripulantes– estavam nas duas aeronaves, sendo 169 no da Gol e 73 no da Azul. Ninguém se feriu.

De acordo com o relatório, às 14h38, o jato da Gol, prefixo PR-GUD, foi orientado a aguardar a movimentação de um outro Boeing, para, em seguida, alinhar na pista, de onde decolaria para Salvador (BA).

Às 14h39, o piloto da Azul avisou a torre que o avião, prefixo PR-AUJ, estava na aproximação para pouso em Congonhas. A aeronave vinha do Rio de Janeiro. O controlador indicou os ajustes necessários para que o jato continuasse no procedimento para aterrissagem.

Momento em que o Avião da Azul comunica a torre sobre aproximação da pista em Congonhas; distância para o avião da Gol (PR-GUD) era de 11 quilômetros
Momento em que o Avião da Azul comunica a torre sobre aproximação da pista em Congonhas; distância para o avião da Gol (PR-GUD) era de 11 quilômetros • Cenipa

Às 14h42, o comandante do voo da Azul visualizou o avião da Gol parado na pista de Congonhas e avisou a torre: “Confirmando, tem uma aeronave na pista aí, controle?”. Nesse momento, diz o relatório, a Embraer E-190 estava a 81 metros de altura em relação ao solo.

Três segundos depois, mesmo após o questionamento, o controlador respondeu: “Azul quatro zero zero três [referência ao número do voo]. Pouso autorizado pela pista três cinco esquerda.”

Momento em que a torre de Congonhas autoriza o pouso do avião da Azul: distância para o jato da Gol (PR-GUD) era de quase 1.300 metros; jato da Azul estava 82 metros acima do da Gol
Momento em que a torre de Congonhas autoriza o pouso do avião da Azul: distância para o jato da Gol (PR-GUD) era de quase 1.300 metros; jato da Azul estava 82 metros acima do da Gol • Cenipa

Ao verificar pelo sistema anticolisão de tráfego (TCAS, na sigla em inglês) e ouvir pelo rádio a orientação dada ao avião da Azul, o piloto da Gol alerta os controladores: “Torre, o Gol uno sete zero zero [referência ao número do voo] foi autorizado a alinhar e manter!”.

Um segundo depois, o controlador percebeu o erro e determinou ao piloto da Azul que arremetesse imediatamente. Mesmo nesse momento, ele errou por duas vezes o código de chamada da aeronave, que era Azul 4003. Nas duas vezes, ele se refere ao voo como Azul 4200.

Investigação do Cenipa mostra que o avião da Azul ficou a menos de 22 metros de distância da cauda do Boeing da Gol
Investigação do Cenipa mostra que o avião da Azul ficou a menos de 22 metros de distância da cauda do Boeing da Gol • Cenipa

“De acordo com as imagens de visualização RADAR, o PR-AUJ passou sobre a cabeceira da pista 35L (na vertical do PR-GUD) mantendo 2.800 ft de altitude ou 169 ft de
altura. Dados mais precisos, fornecidos pelo QAR [gravador de acesso rápido, na sigla em inglês] do PR-AUJ, permitiram verificar que a aeronave cruzou a vertical da cabeceira 35L com 113 ft de altura. Considerando-se que o estabilizador vertical do PR-GUD (Boeing 737-8EH) tinha altura de 41,2 ft, foi possível verificar que a menor separação entre os dois tráfegos foi de 71,8 ft ou 21,7 m”, diz o relatório do Cenipa.

O controlador de voo pediu desculpas aos dois pilotos. “Azul quatro zero zero três, desculpe a informação de pouso autorizado. Cumpre a arremetida.”

Às 14h44, depois, portanto, da arremetida do avião da Azul, o piloto da Gol é autorizado a decolar rumo a Salvador.

Relatório aponta falha do supervisor

O documento do Cenipa aponta ainda uma falha do supervisor da torre. “Em entrevista realizada, ao ser questionado sobre os motivos que o levaram a não intervir, o SPVS [supervisor] relatou que, no momento do incidente grave, estava preenchendo o livro de registro de ocorrências.”

“Constatou-se que ele [supervisor] não estava atento às operações realizadas” pela torre, acrescentou.

Sobre o controlador

As investigações do Cenipa mostram que o controlador envolvido no incidente possuía 11 anos de experiência. O nome dele não foi divulgado.

“Verificou-se, em entrevista realizada, que o controlador já havia sido afastado temporariamente do serviço por motivo de saúde. Segundo o relato do próprio ATCO ´controlador de tráfego aéreo, na sigla em inglês], na época da ocorrência, ele estava emocionalmente abalado por problemas familiares e não estava tendo um sono de qualidade.”

O operador foi descrito pelos colegas como “dedicado e estudioso, sendo bem conceituado pela equipe”. “Além disso, era considerado uma pessoa agradável e de humor estável.”

“Segundo seu relato, à época da ocorrência, vivia um bom momento pessoal e profissional. Ele declarou ainda que, no dia do incidente grave, havia menor demanda de
trabalho em consequência da pandemia de COVID-19. Profissionalmente, foi descrito pela equipe como um indivíduo aberto ao diálogo e de fácil convívio”, acrescentou o relatório.

Medidas tomada após o incidente

Após a ocorrência, tanto o controlador quando o supervisor envolvidos foram afastados de suas funções operacionais. Ambos tiveram a suspensão de seus Certificados de Habilitação Técnica (CHT).

Os dois profissionais foram encaminhados a entrevistas com uma psicóloga do Serviço Regional de Proteção ao Voo de São Paulo.

O relatório apurou que não havia problemas com os equipamentos de radiocomunicação da torre e dos aviões envolvidos. “As aeronaves estavam dentro dos limites de peso e balanceamento especificados pelos fabricantes. Durante a investigação, verificou-se que as condições operacionais das aeronaves estavam normais e não contribuíram para a ocorrência”, diz o documento.

A investigação revelou que “as condições meteorológicas eram favoráveis à realização do voo” e que “o número de operações de pouso e decolagem estava dentro da capacidade ATS [serviço de tráfego aéreo, na sigla em inglês] da pista durante todo o dia da ocorrência”.

Recomendações para evitar ocorrências

Após o incidente, o Cenipa fez recomendações aos órgãos relacionados para evitar incidentes desse tipo no aeroporto de Congonhas.

O órgão sugeriu ao Departamento de Controle do Espaço Aéreo (Decea) que atue junto à concessionária Aena Brasil, responsável pela operação de Congonhas, para incluir hot spots “visando alertar pilotos que operam naquele aeródromo sobre os locais com maior incidência de incursões em pista, bem como os pontos que não podem ser visualizados” pelo controlador.

A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) explica que um hot spot é “um local na área de movimento com um histórico de incidentes ou que apresenta potencial de risco de colisão ou de incursão em pista”. “Por isso, nesse tipo de local é necessária uma atenção maior por parte dos pilotos e motoristas. Geralmente, ele é consequência de uma interseção complexa ou confusa entre pistas de táxi ou entre pista de táxi e pista de pouso e decolagem.”

Outra recomendação ao Decea é para “avaliar a viabilidade, em conjunto com a Aena Brasil, de implementar medidas tecnológicas que elevem o nível de consciência situacional de pilotos e controladores de tráfego aéreo, mitigando os riscos de incursão em pista” em Congonhas.

O Cenipa também orienta ao Decea que as equipes responsáveis do aeroporto sejam comunicadas “com a maior brevidade possível” sobre casos de incursões em pista.

O que dizem os envolvidos

Procurada pela CNN, a Azul não comentou diretamente sobre o fato ocorrido em 2020. A companhia disse apenas que “opera de acordo com padrões nacionais e internacionais de segurança, seu valor primordial, e que segue eventuais medidas preventivas recomendadas pelas autoridades reguladoras”.

A Gol ainda não respondeu.

A CNN também procurou a Infraero, que era responsável pela operação no aeroporto de Congonhas na época dos fatos, mas ainda não recebeu retorno.

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